sexta-feira, maio 27, 2011

Pedido de devolução


Eu acho que estou com medo de ser feliz, porque sempre que eu fico muito feliz, acontece algo de ruim. 
 Charlie Brown
Querido ________,
como redigir tais palavras? Como te dizer qualquer coisa? Não há a necessidade de me informar que estas míseras e retóricas questões podem ser feitas a qualquer outro ser, exceto você. Iniciemos do princípio, vamos à apresentação. Sou eu. Eu sei, não sabes quem sou, e eu também não sei quem és. O fato que sei, é que te conheço, conheço muito bem, a ponto de meus sonhos te conhecerem também. Afinal, acredito que foram eles que me apresentaram à você. Em alguma noite dessas tantas, em que você se divertia com seus dedos tamborilando pelo seu violão, e o som penetrava meus tímpanos, enquanto eu rabiscava linhas mudas e sem sentido. Desde quando veio com seus pertences para o lar da frente, quando abro a janela do meu canto, a vista ficou mais bela. Talvez foi a cor dos teus olhos, ou o esverdeado da sua parede. Que importa? Ficou mais belo, mais perfeito. Combinou com a minha parede branca, e o castanho morto dos meus olhos. Ah, tenho delirado com teu perfume, e o com o roçar dos teus tênis vermelhos. Tenho me concentrado demais em você, tenho lembrado tanto de tu, em meio a devaneios insignificantes, perdi-me, esqueci-me de mim. Imagino agora, aquela sua expressão de pouca importância. Faça o teste: tire o cabelo da testa, e passe a mão por ela. Prazer, estas são suas ruguinhas de expressão, está perdendo a paciência, quase rasgando meus sentimentos e palavras, jogando tudo pro alto, ou pensando em amassar tudo, e jogar no lixinho do lado esquerdo da sua cama. Ah, Deus como queria estar errada, e que tudo fosse o contrário, porém deixe-me com meus desejos e minhas pretensões de lado. Vamos ao motivo que me trouxe remeter- te esta. Imploro-te que saia dos meus sonhos. Deixe-me em paz. Desde quando chegaste, não há uma vez em que piscara meus olhos sem você estar em meio aos meus pensamentos. A Terra já não faz mais sentido. Não há mais razão as horas, os dias. Meu ser pede e clama pelo teu. Sinto a necessidade do teu sorriso. Sinto a necessidade de ficar inúmeros segundos consecutivos te contemplando. Preciso da tua presença. Meu peito palpita aceleradamente em presença do teu ser. Seu caminhar me alucina. És como droga para mim. Necessito de ver-te todos os dias. Sua voz silenciosa me aquieta.  Preciso de ti. Ah, como já pediste aos céus que me livraste deste peso. Não sei o que seja isso, e nem porque escolheste a mim. Não seio o que é amor, ou paixão. Nunca me senti de tal modo. Ah, me sinto tão estranha, e algo como lágrimas vem brotar em meus olhos, quando penso que nunca terei-te. Por isso, meu caro, imploro-te que sumas de mim. Eu preciso voltar para meus livros, e minha vida trancafiada em meus preceitos. Preciso retomar-me. Preciso das cores da minha vida. Devolva o perfume do meu ser. Devolva meu coração, afinal não me deste o teu, e sinto minha pulsação se esvaindo a cada minuto que passa. Me devolva a mim. Volte para tua vida, e deixe com a minha. Assim, pararei de criar expectativas mortas sobre tua pessoa, e retomarei minha rotina.Com todo respeito do mundo, não me perturbe mais em meus sonhos, pare de me fazer suspirar. Afinal, nem sei como te chamam, não sei teu nome. De qualquer modo, acho que deves saber que o chamo em meus escritos de "amor". Deves ser meu amor, não sei o quanto essas três palavras podem significar, mas em minhas pesquisas  constatei que é o máximo de sentimento que pode ser grafado, então, eu amo você. 
P.S: Para a devolução, coloque tudo em baixo da minha janela. Pegarei o mais rápido possível. 
Com amor, 
Eu.

segunda-feira, maio 09, 2011

Minha vida, ou algo de mesmo significado irônico.


E então me agarro aos joelhos. Sinto a lágrima correr, e a tristeza corroer por dentro, e ela faz questão de o fazer, vagarosamente, o mais devagar possível. Então a saudade, inerte, me fita sentada ao meu lado. Com as duas mãos grudadas no meu pescoço. A música me embala, e eu não posso dançar. O medo a prender meus pés e mãos. O corpo imóvel, inerte de amor. Sem poder ter a liberdade de dá-lo por completo. Por não existirem palavras suficientes, por não existirem meios disponíveis, por haver fatores mais que limitantes.Mas ele existe, eu ainda existo. E eu vou indo. Ou melhor, ficando, desse mesmo modo. Sussurrando em pensamentos, gritando em lágrimas, clamando em palavras, e fingindo em sorrisos. Tantas perguntas pairam sobre mim, e flutuam pelo meu corpo e ser, quando é que as coisas vão retomar aos seus devidos lugares? Quando é que a vida realmente terá o seu verdadeiro significado? Afinal, até então tenho existido, e nada mais. Tenho imaginado, e me confortado com o que me tem dado forças para existir. É assim que tem sido meus dias. Obscuridade total, iluminado com sorrisos passados e verdadeiros, sonhos sem esperança, e fuja fracassada da minha realidade que perfura. Os pensamentos, são os mesmos e sempre serão. Os olhos na mesma direção, mesmo que também tenha um brilho fajuto, ainda tem a mesma intensidade. Tenho me perdido em devaneios, ou coisas do tipo. Tenho falado demais, ou me calado. Venho tentando sobreviver, do meu modo, sem ninguém perceber como meu ser está desfalecido. Meu coração estilhaçado, ainda que descompassadamente retoma as batidas, vez ou outra paralisado. Por minha sorte, e razão de sofrimento, tenho meu marca-passo natural. Tenho colírio para os olhos. E eu vou indo. Não sei até onde. E a pergunta que mais me afronta talvez seja: até onde é o meu limite?

terça-feira, maio 03, 2011

E o mundo ainda gira, na mesma velocidade.


Os joelhos tocavam o chão gélido, de modo que o frio cortava-lhe nos ossos. O belo par de olhos contemplava o cadáver estendido. Ele contemplava os olhos verdes esbugalhados com a mesma ternura, a face mergulhada em uma espécie de pó mortal, era a própria morte estampada, e por alguma razão ele ainda a admirava, e via a mesma beleza. Os dedos percorriam toda a face dela, e contornavam os lábios pintados de roxo, com tons avermelhados escarlate. Sentia uma sensação desconhecida. As forças se perderam em alguma parte. A voz sumira. Agarrou-se ao corpo, frio. As lágrimas banharam. A dor. O coração partia. Lentamente. Uma faca, entrando e saindo do peito, vagarosamente. A pior das dores. O ser desfalecia. O mundo não girava mais. Os olhos nada viam, agora. A escuridão Sentia como se tivesse com as mãos atadas. A multidão se formava ao redor. Ele queria expulsá-los dali. Queria ficar a sós. Sumir, agarrado ao corpo da amada. Por que ela não ficara? Por que não esperara mais alguns segundos? Ah, se ele não tivesse voltado o rosto para ela. Se ele não a tivesse beijado. Mas a rua estava deserta, não estava? Ele se sentia culpado.   Um ser, masculino, caminhou com as pernas entrelaçadas, cambaleando. Atônito. Proferiu palavras que não cabiam na situação. Dançou sobre os próprios pés. Agachou-se no chão. Olhou, sem entender o casal. Agora morto. Ele matara, mas não se culpava. Não se lembrava. Não sabia onde estava. Dormiu, impregnando o cheiro de álcool. Ela ainda usava o vestido branco, o mesmo da mãe. A face banhada em sangue e lágrimas, do amor de sua vida. E ele, ainda balbuciava, e repetia os votos. As lágrimas, corriam, sem direção. Desfalecendo, colou seu rosto ao dela. Beijou-a. Manchou os lábios de sangue. O penteado tinha alguns fios rebeldes. A multidão aos poucos se afastava, com a mão levada a boca. O mundo ainda girava, ao mesmo tempo que a dor mortal latejava.